terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Conquistar o Mundo

O Mostrengo
O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
«El-Rei D. João Segundo!»

«De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso.
«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-Rei D. João Segundo!»
Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as repreendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»

Fernando Pessoa, Mensagem, 1934
Quando se sai de Portugal, onde quer que possamos ir, encontramos sempre um português. Os portugueses são um espécime que se espalhou pelo planeta, descobriu meio mundo, e provou a esfericidade da Terra. Esses grandiosos feitos dos nossos antepassados foram realizados por homens pequeninos (O Sr. Gama fez o maior feito da História da humanidade, até à data, com apenas 30 anos!), com parcos meios, e mudaram a História para sempre.
Cada vez que um português sai lá para fora, tem de tentar ser como o Sr. Dias que é retratado no poema acima. O Sr. Dias ia com medo. Tremeu muitas vezes antes de dobrar o Cabo da Boa Esperança. Mas manteve-se firme até ao fim, e disse no fim de tremer três vezes:
“Aqui ao leme sou mais do que eu:”
Como ele, vamos todos em missão, em representação de Portugal. Em cada português que é visto lá fora, estão todos os portugueses.
“Sou um povo que quer o mar que é teu;”
Vamos lá para ganhar! É sempre para ganhar! Nem que seja a feijões é para ganhar!
“E mais que o mostrengo, que me a alma teme”
Acima de todos os medos que possamos ter, como qualquer Cabo das Tormentas, ou outra qualquer tormenta que nos assole a alma.
“E roda nas trevas do fim do mundo,”
Podem acontecer coisas mesmo más!
“Manda a vontade, que me ata ao leme,”
O que me faz estar aqui,
“De El-Rei D. João Segundo!”
É a vontade do meu soberano. A minha, a nossa!

Hoje não há um Rei, e ninguém nos manda sair de Portugal, mas temos de ter sempre presente, que temos de honrar os nossos antepassados e os seus feitos. Não estaríamos aqui desta forma se não fossem eles. Nos Jogos Olímpicos da Grécia Antiga, os louros eram entregues ao soberano, depois da glória alcançada. O desempenho desportivo de uma nação é um bom espelho do desempenho enquanto nação. Infelizmente o desempenho desportivo de Portugal não é brilhante. Para alguns, de manhã está-se bem é na caminha, para outros só se está bem, depois de esmurrar um árbitro, mas felizmente não somos todos assim. O Sr. Ronaldo, com certeza não chegou lá, sem horas infindáveis de dedicação e trabalho. Noutro campo, a Mariza não espalha magia pelo mundo sem esforço. São, ambos, grandes embaixadores de Portugal no mundo. Não foi sorte…
Para terminar, o Sr. Dias, que queria sempre mais, acabou por morrer nas Tormentas, em 1500 a acompanhar a expedição do Pedro Álvares Cabral. Ah, que esse Dias era teimoso!

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